segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Cinza e cor

Assim como vc menina, também já fui esquecida
Rostos passaram por mim e não me viram
Muitos beijos não eram troca, só abuso

Já gritei por um olhar, mas não veio
Mas na maioria das vezes me faltou coragem pra gritar
Meu mundo também já foi e ainda é cinza

Mas você menina, me ensinou preciosa lição
Que os sonhos colorem nossas vidas
Que neles me encontro como sou

Ontem, olhando em seus olhos, vi
Minha solidão e fome pela vida
Meus cinzas e minha cor

Chorei seu choro pelas pessoas que não me viram
Tremi no seu frio por afeto e calor
Mas no meio disso sonhei seus sonhos coloridos

Na duração de um fósforo vi luz pra toda minha vida
Dei risada das gargalhadas da minha vida
Abracei os brinquedos que tenho

E pela sua lembrança me lembrei
Dos inúmeros afetos que tenho
De todas as possibilidades de recomeços

E veio seu último desejo
E em mim a mesma vontade
Reencontrar o que amamos pra fugir do nosso cinza

Você encontrou isso através da morte
Não houve dor nem luta
Paz numa entrega serena

Ao olhar pro seu corpo caído
Também desejei essa fuga
Mas pela vida

Quero me reencontrar num longo abraço
Juntar meus cinzas e minhas cores
E reviver

Obrigada, menina
Obrigada as mãos que te dão vida
Obrigada por doar seus últimos suspiros a mim!


(Esse texto veio depois de assistir ao espetáculo de bonecos "Sob seus olhos" da Cia Polichinelo baseado na história "A pequena vendedora de fósoforos" de Hans Christian Andersen www.ciapolichinelo.com.br)

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Pão e afeto

Preparar os ingredientes. Escolher com cuidado cada utensílio. Dedicar-se e deliciar-se.

É preciso ir sem pressa. Esquentar o forno previamente. Fechar as janelas pra não entrar vento e desandar o crescimento.

Mexer delicadamente. Acrescentar aos poucos. Sentir quando deve parar.

Não dá só pra olhar. Tem que cheirar, colocar a mão. Envolver-se de corpo e alma.

Tem que testar. Fazer mudanças. O tempo, o vento, a água mudam o resultado.

Haverá receitas que darão erradas. Uma, duas, infinitas vezes. Mas alguma há de dar certo. E quando não der, não jogue a receita fora. Invente. Reinvente.

Os momentos de descanso são importantes. É necessário ficar longe por um tempo. Aproximar-se, depois. E então se tocar novamente.

Alguns momentos você precisará amassar com energia. Noutros com muita delicadeza, envolver todos os ingredientes.

Crie formas e modelos novos. Nem todas as formas servem para todas as receitas.

Esteja preparado para os desarranjos, falta de ingredientes e até preguiça. Quando der ria dos desastres e comece tudo de novo.

Ao colocar no forno, tome cuidado. Observe. De atenção. Não descuide. Pode passar do ponto, ou nem chegar.

Sinta o perfume. Desfrute do cheiro. Sinta salivar.

Importante. Cuidado ao tirar do forno. A vontade em comer pode feri-lo. Espere amornar. Assopre se necessário.

Finalmente, saboreie e curta. Mas não esqueça de que todas as etapas são importantes.

No pão e no afeto.